Palco

Sei que deveria começar a conjugar tudo no passado. Sei também que você odeia falar disso (embora sempre tenha começado as conversas). Sei que saudade já não é mais o que era. Mas espero que você também saiba de coisas, que saiba que eu sou assim mesmo, dramática, intensa, visceral, passional, tudo isso pronto pra entrar em erupção bem perto da superfície. Você sabe que eu sei que deveria deixar isso tudo no gelo, mas eu não consigo. Eu sou desse jeito, você já deveria ter se acostumado. Sou, por natureza, apaixonada. E não consigo deixar por muito tempo presa essa minha urgência, toda essa tensão que sai pelos poros e até o cobrador do ônibus percebe. Tudo aqui dentro bate nesse ritmo louco, nesse compasso descompassado, tudo explode... mas isso eu já disse que é segredo.

(que é livro e é surpresa e é sem nome. E é forte)

Fato é que eu não posso me calar. Nunca me calei. Sempre gemi ou gritei, ainda que minhas palavras não chegassem a você. Até porque, sempre há algo a ser dito. E é isso que eu faço, não é? te digo coisas. E você me diz outras. E em algum lugar entre o que eu digo e você entende e o que você diz e eu entendo nós moramos dividindo um momento, aquele momento sem tamanho de quando nossos pensamentos se cruzam nas tardes sem fim (não é difícil, meus pensamentos te esperam numa constância absurda, sempre ansiando pelo momento - nosso momento - em que você vai estar disposto a cruzá-los). Foi assim que começou, lembra? você dizendo, eu cedendo, nós sintonizando. Agora estou acostumada a te dizer tudo. Vontade de chegar até aí e cochichar no teu ouvido (independente de quem esteja ao seu lado) aquilo tudo que você chama de bobo. Mas e daí? eu sou boba. Sou melodramática, sou teatral. Sou atriz, péssima atriz. E se eu te deixar sem as minhas palavras, sem o meu apoio? (porque você é tão seguro da minha presença que poderia tatear o escuro e me encontrar aonde deixou) Você só perceberia algum tempo depois e viria num dia inesperado dizer que sente a minha falta, como tantas vezes. E perguntaria de novo se ainda tem tempo pra recuperar. E eu faria bico, viraria o rosto, até que você chegaria tão perto a ponto de fazer o meu sangue congelar... e pro coração voltar a bater eu sorriria, riria do seu jeito e diria, como sempre, que você não passa de um moleque bobo.

(porque é isso que eu faço, te entendo e te aceito)

Entendo suas ocupações, seus desejos, seus sonhos, seu momento, seus brothers, suas conquistas, seu orgulho, suas historias, suas mensagens, suas desculpas, seus medos (sim, você tem), entendo perfeitamente. (E não faça essa cara de não gostar de ser decifrado agora, porque é tarde demais. Precisei de um pouco mais de cinco minutos pra te decifrar, tive que sangrar um pouco, passar frio, passar fome de você, correr atras, mas agora eu peguei seu jeito.) Entendo sobretudo a nossa relação, sei que não me cabe no seu mundo. Podia usar isso que sei pra lutar contra mim e assim te arrancar pedaço por pedaço... mas você enraizou e já é parte da minha estrutura. Sei decodificar as suas falas, saiba ler as minhas. Pegue essas palavras pra você, porque são suas.

Devia ser menos teatral quando se trata da gente, não insistir tanto nisso, não usar tantas falas prontas pra te convencer. Poderia, pelo menos dessa vez, deixar de lado as minhas ceninhas. Aqueles dramas que, no fundo, só pedem atenção. Deveria engolir o choro algumas vezes, e fingir ser forte e corajosa. Mas, a vontade de não te deixar ir antes de me ouvir toma conta da possibilidade de, sabiamente, ignorar todas essas realidades imutáveis às quais eu não tenho mais (se é que um dia tive) poder de mudar. Saiba que seus olhos tem o poder de me deixar muda, de trazer todo meu oceano a tona. E se não consigo verbalizar muito quando você insiste pra que eu diga o que eu acho, é porque me perdi em você.

Mais do que qualquer coisa eu queria que você soubesse que eu estou perto, bem perto, do meu jeito de sempre. Espero que você ainda saiba qual é o meu jeito de sempre... que entre tantos jeitos girando na sua cabeça você ainda não tenha esquecido o meu. Me sinto um passo à sua frente, você sabe pouco de mim (e acha que sabe muito, o que me põe em mais vantagem ainda), mas eu quero, como nunca quis, que você me descubra. O que eu tô querendo dizer é que tá difícil continuar arquivando tudo que eu queria te dizer na categoria 'algum dia'. Essas palavras estão me cortando por dentro, por isso faça o favor de pegá-las: são suas.

Eu sou uma péssima atriz, lamento por isso. Péssima porque quero atuar e deixo transparecer as verdades, deixo o choro rolar, deixo as frases pela metade, mudo de personagem, sento na platéia... e você é o diretor (ainda que, graças a deus, não saiba disso). Isso que trago aqui é tão maduro que me assusta, criança que sou. Descobri que o que sinto nunca me fez mal - você me fez, porque não sabe lidar com o que sinto. Mas o sentimento não, me fez crescer como nunca pensei, dividiu incontáveis horas comigo. Eu penso e agora não me dói, só me aquece, me estremece, me enche com alguma coisa que eu não conhecia (acho que é o que chamam de ternura)... e disso nasce uma certeza, ou uma possibilidade.

Mas prometo que você continuará aqui comigo por um longo tempo. Prometo tentar te compreender. Prometo seguir com esse amor explosivo dentro de mim. Prometo me agarrar - com unhas e dentes - ao meu segredo. E prometo cumprir todas essas promessas. E prometo, ainda mais, prometer tudo de novo, quantas vezes for preciso.

I'll never let you fall
I'll stand up with you forever
I'll be there for you through it all...

(e tomara que você não leia isso tão cedo, meu menino, porque você ainda não sabe o que fazer depois).