A lógica da imaginação é diferente da lógica do pensamento racional. Imaginação ou Imitação? Até pouco tempo se dizia que arte é a imitação das coisas. Parece óbvio com um pensamento Aristotélico, de que a imitação é um fenômeno irredutível da natureza humana. Como um instinto. Podemos considerar também a imitação como fonte de prazeres. A recriação da realidade gera identificação sem gerar conseqüências físicas. Certamente o conceito é aplicável às atitudes ao longo da vida. A repetição de situações cria um ciclo difícil de ser quebrado, é um caminho conhecido, é uma trilha já feita em que não necessita perder-se. Por mais que se chegue ao mesmo lugar.
Entretanto, ao admitir que a imitação é o objetivo geral da arte perde-se a espontaneidade e o poder produtivo do artista. A arte não descreve as coisas em sua verdade, ela de certa forma falsifica. Por exemplo, os neoclassicistas tinham como principio a reprodução da natureza não num sentido geral, mas sim “la belle nature”. Assim a arte é muito mais que uma cópia do mundo empírico, é também um constante pulsar de emoções, sentimentos e paixões. Nesse sentido, ela deixaria de ser uma imitação de coisas para se tornar uma válvula de escape do nosso mundo interior.
E então, como definir linhas entre a arte e a não arte? Como o mundo interior de uns é arte e de outros não? R. G. Collingwood diz “O que o artista está tentando fazer é expressar uma emoção dada. Expressá-la e expressá-la bem são a mesma coisa... cada palavra e cada gesto que cada um de nós faz é uma obra de arte.”
Capacidade todos possuem. Talento é um conceito relativo. Talento independe do artista, depende sim da visão que um conjunto de outras pessoas sobre sua obra. O que pressupõe que pra ser artista é preciso antes de tudo ter sua obra. Considerando obra a união de Arte e Engenho, ou seja, do dom natural e da forma. Separar esses dois conceitos também é ingênuo. Seguir o raciocínio de Formalistas Russos, Estruturalistas ou leigos tem o mesmo fim, que é o isolamento. Ser arrastado apenas por emoção é puro sentimentalismo, não arte. Não basta apenas conceber a arte em seu mundo interior, é preciso transmiti-la ao mundo empírico. Malarmé escreveu certa vez que “A poesia não é escrita com idéias, é escrita com palavras”. Essa visão contrapõe um ideal utópico que busca ignorar os conceitos de forma e apegar-se ao talento.
Fazer arte não é simplesmente fazer uma releitura de uma realidade pronta, tende a ser mais uma redescoberta da realidade. Consequentemente inversa à linguagem e à ciência. Estas buscam abreviar o real, enquanto que a arte busca sua intensificação. Ela não procura porquês, transporta-nos ao mundo da intuição. A ciência é uma abstração, e abstração significa sempre empobrecimento. Tudo que é passível de fórmulas torna-se simples. Mais que acessível torna-se esgotável. Já na arte, os aspectos de um único objeto são inúmeros. Exemplificando, o pintor L. Richter certa vez reuniu-se com mais três amigos com o objetivo de pintar uma mesma paisagem. O acordo foi representá-la com a maior precisão possível. Ao final, haviam quatro pinturas totalmente diferentes. É assim como na vida, cada acontecimento tem pontos de vista diversos. Cada pessoa envolvida vê de uma forma.
Afirmar que o artista, ou o poeta, recria emoções e paixões não significa de forma alguma que este seja escravizado por elas, tão pouco o leitor. Ao lermos Shakespeare não nos contagiamos pelas características de seus personagens. Isso porque olhamos através das emoções, penetrando em sua essência. Agora alguns citam o exemplo de Werther, personagem que Goethe criou em sua juventude, e questionam a influencia sobre a sociedade alemã da época, levando diversos jovens ao suicídio. Entramos então em outro aspecto indispensável da arte, o contexto histórico, a ligação da obra com a sociedade que a lê. Dificilmente seriamos induzidos por uma obra que tratasse temas diversos aos contemporâneos. Foi essa a quebra inestimável proposta por Goethe, ao criar um herói contemporâneo aos leitores da obra que se contrapunha à Aquiles e Odisseu que ainda permeavam o imaginário popular, um personagem que se assemelhasse à realidade, sentindo como sentiam os jovens alemães daquele momento.
Vivemos todas as nossas paixões em todo seu alcance. A arte nos propõe uma visão do mesmo, entretanto, na obra alheia não somos controlados por nossas emoções. Isso porque não dependemos mais de uma realidade imediata, mas sim de formas estéticas, transformando-as em livres e ativas.
Jamais nos interessaríamos em suportar no mundo empírico todas as emoções de Édipo ou Rei Lear, e se optássemos por isso provavelmente não sobreviveríamos. Mas a arte transforma tudo isso em autoliberdade. Cassirer defende que a arte deve sempre proporcionar-nos mais movimento do que mera emoção. Transportando-nos entre a realidade empírica e a realidade inventada.
ps: não entendo nada de arte, não entendo nada de vida.
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