19 de maio de 2007

Não. Não coma o bolo quente.

Ela desligou o computador, o vento frio anunciou a chegada do inverno quando ela fechou as persianas do escritório, estava cansada, desanimada. Mal se lembrava que era sexta feira.
Entrou no carro e ligou o rádio enquanto procurava uma lanchonete para comprar algo para comer durante a calma noite que teria.
Começou a cantar junto a melodia antiga e alegre, Demorou para perceber o celular tocando. Atendeu. Do outro lado a voz conhecida de uma amiga desde os tempos de cursinho. Mudou imediatamente o rumo do carro após a proposta para um happy hour num barzinho próximo.
Rodou umas três vezes a quadra antes de encontrar um lugar para estacionar. Chegou a mesa meia hora após a ligação. Cumprimentou os conhecidos e esperou ser apresentada aos demais, principalmente ao moreno de olhos mel que estava na ponta oposta com um sorriso deslumbrante. Foi apresentada a todos, inclusive a ele, recebeu em troca de sua empolgada matéria sobre ela mesma um leve aceno de cabeça.
A hora seguinte foi de tentativas furadas de chamar a atenção. Tinha ido até o banheiro, abriu dois botões a mais da blusa e tirou o encharpe. Correu até o carro para desenterrar o seu batom favorito que jurava tinha deixado ali mês passado. Fazia malabarismos e exercício de respiração para parecer pelo menos 2 quilos mais magra. O perfume que passara na noite anterior para o jantar na casa de uma tia certamente já estava vencido. Optou por lavar as mãos e o rosto com o sabonete do banheiro mesmo. Tentava de todas as formas prender o interesse dele com suas historias, que estavam soando histéricas, sobre suas ultimas reportagens. Não era possível que fosse tão insignificante, tinha menos de 30 anos, uma carreira como jornalista e um belo carro. Por que não? Já estava sozinha a quase dois anos, e seria muito bom tirar o atraso com o moreno, com seu charme intelectual e maduro... Se ele a olha-se direito!
Até o fim da noite tropeçou intencionalmente nele umas quatro vezes e bebeu um pouco demais de Martini. Acordou na manhã seguinte na cama. Na sua cama. Da sua casa. E sozinha. A semana passou devagar, conseguiu o email do dito cujo. Trocaram algumas mensagens, depois o numero do celular, o endereço.
Ele era um pouco distante nos emails, mas ela tinha certeza que era pura timidez. Afinal, ele era o homem que estava esperando por tanto tempo. E nem precisava de um segundo encontro para ter a certeza que estava totalmente apaixonada. Se sentia completamente infantil, e absurdamente tão mais mulher! Gastou os trocados que tinha guardado em roupas e perfumes novos. Arriscou-se até a ir até a seção de lingeries e levar uma. Preta, já que achava as vermelhas vulgares demais para uma primeira vez.
Chegou do almoço no escritório e lhe avisaram que ele havia ligado. Demorou duas horas para retornar, apenas para não parecer muito interessada. Finalmente não aguentou mais. Ligou para o número da agência bancária onde ele trabalhava. Ele atendeu. Surpreendentemente feliz e carinhoso. Disse que tinha uma novidade para contar e que ela logo descobriria. No fim da tarde chegou o carteiro, tinha um envelope todo decorado pra ela. Um convite de casamento. Junto um bilhete: 'Isso não significa tudo, gostaria de vê-la nesse endereço essa noite...'
Ele ia se casar! Foi a primeira coisa que martelou em sua cabeça, logo após as palavras 'essa noite'... Tinha certeza que o amava, ou não? Nunca tinha seque conversado a sós com ele... Mas o amava sim, e ele também sentia algo. Foi ao encontro. Fizeram amor. Fizeram durante os sete anos que ele ficou casado. Até a mulher dele descobrir e pedir o divorcio. Ele se divorciou da esposa. E ela nunca mais o viu. Sequer pra contar da criança que tinha no ventre.
Nunca coma o bolo quente. As coisas tem seu tempo. Se elas não o seguem, não há como serem boas.

Um comentário:

- disse...

-
Certo. Eu admito. Não posso deixar de sentir isso, é ridículo, pode ser até infantil, mas honestamente: eu tenho inveja de você. Não encare do modo ruim ok? Digamos apenas que admiro esse seu modo de fazer parecer tudo tão fácil... Como se a genialidade escrita não fosse um dom, mas apenas um exercício de mercado. É uma pontadinha ciumenta que pode me condenar como uma pessoa pior mas sem dúvida alguma te condena como uma escritora das grandes.

orgulho da tia Dani!
XD